Realidades empresariais - A Economia da Experiência: o fim da mediocridade? | Parte 2
(Por Alexandre Inserra)
Perfeita coerência e fino alinhamento entre as mentes das áreas estratégicas das organizações e suas correspondentes operacionais têm sido temas recentes e recorrentes em abordagens com o ponto comum de serem iniciativas cujo foco é a “Experiência do Cliente”, baseadas em princípios da “Economia da Experiência”. Setores tradicionais e relevantes na composição do PIB passaram, de forma irreversível, a integrar a Economia da Experiência; neles, o crescimento e a própria manutenção de participação de mercado dependem diretamente – e de forma crescente quanto à sua relevância – de sensações positivas relativas à Experiência dos Clientes. Mas será que as práticas de gestão associadas às entregas pífias ficaram realmente deixadas para trás? Pragmatismo e isenção aplicados à busca por sintomas e riscos de mediocridade nas experiências entregues à base de Clientes são indispensáveis. O combate organizado à mediocridade nas entregas traz potenciais de ganhos análogos àqueles proporcionados por grandes inovações nas cadeias de valores.
Amargas são as sensações vividas e guardadas por aqueles que tiveram diagnósticos e assistências negadas pelo seu plano médico, até que conseguissem seus direitos legítimos via liminar judicial. Semelhantes e tão amargas são aquelas experimentadas pelo segurado que precisa de senha, protocolo, e três semanas de prazo para receber “a aprovação da vistoria” de sua seguradora, autorizando, finalmente, o conserto da frente do automóvel batido:
“Tantos anos pagando seguro, e agora exigem que eu prove que bati o carro sem querer...?”
O conserto precisa de 2 a 3 dias para ser concluído fisicamente, mas a seguradora permanece praticando um modelo processual, onde o fluxo de informações, (e de aprovações), paralelo ao físico de peças e serviços, consome até 10 vezes o tempo correspondente às atividades centrais da agregação de valor, o reparo efetivo do patrimônio assegurado.
Durante processos de transformações, em momentos de grande disruptura, tal qual atravessamos atualmente, os excessos são cortados, as adaptações são abruptas, comportamentos são redefinidos, gostos mudam e o que parecia “insubstituível” se torna obsoleto.
Posturas gerenciais acomodadas em torno da mediocridade, ou meramente coniventes com o risco de ela fazer parte da experiência proporcionada têm nos permitido assistir a mudanças muito inesperadas nos mercados onde atuamos, novamente amargas, desencadeadas por mudanças bruscas da percepção de muitos consumidores, influenciados por menos pessoas, que se sentiram vivenciado experiências desagradáveis, quando da interação com aquela marca, produto ou serviço. Experiências agradáveis se propagam. As amargas também.
São em momentos com os atuais que os consumidores exercem seu “poder de moeda”, e elegem o que não querem mais, porque “aquilo não tem a menor necessidade”.
A realidade é que “nunca teve”, já que “necessidade” pode ser relativizada e, de certa forma, mesclada com a subjetividade de uma vontade, ou com uma certa “pré-disposição” ao consumo de determinada proposta de valor.
Havia aí, portanto, uma expectativa quanto às emoções e valores associados, que se demonstrou frustrada, o que provoca imediata rejeição, já que o momento impõe profundas adaptações.
Por dificuldades de abastecimento e consequente faltas de produtos de consumo rápido, (FMCG), opções alternativas surgem, ou são percebidas, permanecem e quebram fidelidade de anos; a disruptura associada à pandemia, como já havíamos concluídos em textos anteriores, acelerou processos de transformação, sendo em vários casos, a “centelha” aceleradora, necessária para o desencadeamento de variações comportamentais, capazes de definirem novos padrões.
Demonstrou-se nos últimos 12 meses que a mediocridade tende a ser expulsa de “vários campos de jogo”, quando consumo adquire maturidade, percepção sensorial, alguma possibilidade de escolha, (mesmo que não muito óbvia), e a exigência externa à normalidade para que se mudem um grupo considerável de hábitos.
Quando “o juiz” da partida é a consumidora chateada, o cliente frustrado ou o paciente maltratado, assim que a mediocridade é “experimentada” em campo, não há cartão amarelo; mostra-se logo o vermelho. E isso tem causado perdas significativas de altitude em voos para os quais parecia que nem o céu seria o limite.
Mas qual é a gestora ou gestor, quem é o estrategista ou Board Member que sugere, deliberadamente, a mediocridade como postura de atuação? Nenhuma. Nenhum.
Ninguém responsável por pensar e decidir sobre a estratégia da organização pleiteia diretamente o uso da mediocridade.
Mas ela se instala e cresce onde há zonas de conforto, e principalmente onde há o engano perceptivo estratégico, de que sucesso momentâneo, mesmo que duradouro, será eterno, sem investimento de energia em transformações.
E voltando ao ponto de partida: incoerências e carências de comunicação e alinhamento entre as mentes que elegem a estratégia das organizações e suas correspondentes nas operações demonstram ser fatores muito contribuintes para a percepção de que as causas e needs relevantes dos target-groups não são sequer escutadas, entendidas, endereçadas.
A ilustração vem de um caso clássico muitas vezes vivenciado: “C-Level” promovendo campanhas “top-down” para propagação dos valores de “foco total no Cliente” e na importância fundamental de prestar o melhor serviço naquele segmento, valores e missões heroicas e comoventes nos quadros de aviso, ao passo em que times de vendas, de supply-chain e de finanças reportam-se via indicadores antagônicos aos interesses dos Clientes na condução e nas interfaces dos processos de negócios, cujo objetivo histórico era promover cost-savings e resultados atuais práticos irrisórios, sem importância em P&L, mas associados a grande frustração da Clientela, sem que nenhum instrumento gerencial a detectasse.
Da mesma forma que inovações disruptivas são capazes de criar formas inéditas de geração de valor, e, portanto, de aferição de receita e resultado, o combate bem estruturado a eventuais focos de mediocridade nos longos elos internos de ligações entre mentes estratégicas e seus pares operacionais tem se mostrado um excelente instrumento para reduzir os riscos de cartão de vermelho nas duras partidas que já estão sendo jogadas e que todos teremos pela frente.
Um sintoma facilmente detectável por qualquer um dessa cadeia é a verificação da existência ou não de vias de mão dupla nessas conexões. De uma forma ampla: os métodos e os processos, suas respectivas ferramentas, as competências humanas, os ativos produtivos, mas principalmente, o ambiente organizacional vivenciado nas conexões organizacionais, esses elementos têm sido capazes de promover, de fato, ciclos positivos de retroalimentação entre operações e estratégia?
O autor agradece a sua atenção. Este é o artigo #7/21 e foi escrito originalmente em lingua portuguesa, e não há, por enquanto, versões em outros idiomas. Publicado de forma inédita em 22.03.2021. Por favor, deixe seu comentário abaixo. Se preferir, envie sua mensagem via e-mail diretamente para o autor. Fique à vontade para compartilhar este artigo copiando este link. Todos os direitos reservados aos coautores e à PRIMORIUM.
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